ouvi nessas esquinas...

ouvi nessas esquinas...

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(Por e para V.)
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Não havia mais nada a dizer. A porta fechou-se e lá fora ficaram quietas as árvores e as ruas abandonadas pela tia, uma mulher imensa, ruiva de cabeleira encaracolada e pele sardenta. Uma mulher altiva e rude que as mal tratava fisicamente com um chicote velho, como uma cauda de macaco morto a tiro. As divisões surrealistas da alma das crianças velhas, e os cobertores que cheiravam a mofo e a fumo de cigarros apagados nas costas e nas pernas peludas.

Gritava por vezes:

- Teresa! - Mas Teresa não respondia. Muda no seu silêncio virginal, mas cheio de sangue a escorrer pelas duas pernas abertas, escancaradas fazendo adivinhar a sua ostra, já sem pérola, mas brilhante e húmida e morna, treme por dentro da pele, por detrás da superfície da pele. Olho para o lado, existe uma esquina onde durante anos esperou por ele. Fizesse frio ou calor, lá estava, esperando. Olhava para a multidão adivinhando o seu rosto. E sempre se desiludia, sempre! Ficou assim para sempre. Para sempre? Sempre é sempre muito tempo, e indefinido para mais… Por ventura, serão as sombras verdes que punha nos olhos? Ou as pestanas postiças mal colocadas? Não. Era apenas o seu olhar, luz vaga no quarto ao lado, ainda os recortes de pessoas que passam, e cá dentro a mão no lençol de flanela amarela. Sempre gostou da sensação da flanela junto ao seu corpo frio e magro, pode-se mesmo dizer ossudo. Existem sempre reticências num ponto final.

2 comentários:

polegar disse...

juntando-se vários pontos finais obtém-se sempre a dúvida da reticência. porque será?

Anónimo disse...

Esquisitos os cadáveres...
lhe beijo marquesa.

seu sempre sub omisso
V.